Elas devem ir para escolas regulares ou especiais? E, quando crescerem, vão ter condições de conseguir um emprego?
Uma
das maiores preocupações das famílias que estão no universo particular do
autismo é com o futuro dessas crianças. Elas devem ir para escolas regulares ou
especiais? E, quando crescerem, vão ter condições de conseguir um
emprego?
No
último episódio da série, o doutor Drauzio Varella mostra que o diagnóstico de
autismo, em muitos casos, não impede que a pessoa trabalhe, seja produtiva e
construa uma vida.
O autismo afeta quase todos os aspectos do
comportamento: a fala, os movimentos do corpo, o interesse por amizades, a vida
social, as emoções. O mundo autista é muito variado. Vai dos que nem falam, até
aqueles com habilidades incríveis. Como educar crianças com necessidades tão
diferentes? Colocá-las em escolas comuns ou especiais?
Como incluir no
mercado de trabalho pessoas com tanta dificuldade para compreender as intenções
dos outros? Inclusão. É o tema do último episódio da série Autismo: universo
particular.
O
autismo deve ser diagnosticado precocemente para que a criança possa ter acesso
a profissionais especializados. É nessa fase inicial que o tratamento tem os
melhores resultados.
Educação
Crianças
com autismo podem desenvolver talentos específicos em determinadas áreas do
conhecimento. Desde que essas habilidades sejam identificadas e estimuladas de
forma inteligente. Esse passo inicial muitas vezes depende da
escola.
“Se
ele puder, deve ficar numa escola regular até o momento em que ele começa a
sentir que ele não é igual aos outros, que ele está sempre atrás demais e que
isso comece a trazer problemas para ele. Mas eu não vejo por que um autista com
deficiência intelectual severa estar dentro de uma classe regular. Ele está
perdendo tempo. Ele não está se socializando”, avalia o doutor Salomão
Schwartzman.
O
Lucas sentiu na pele esse problema. Até a quinta série, frequentou uma escola
convencional. “Eu não lembro o que, mas não me sentia bem com aquela gente. Não
pareciam ser, como diziam, amigos de verdade. Como se rissem atrás de mim, sobre
minhas costas e nunca tinha notado”, lembra o jovem.
Crianças
com autismo são alvo fácil para as maldades típicas da infância. Agora, Lucas
está matriculado na AMA, a Associação de Amigos do Autista, e também estuda em
casa, com a ajuda da mãe.
Em
Curitiba, os pais de Thomas e Nicholas encontraram uma fórmula intermediária
para a educação dos filhos.
Thomas,
que tem um tipo mais leve de autismo, estuda em uma escola particular de alto
padrão. Aos 15 anos, Thomas tem um talento especial para matemática avançada e
ciência da computação.
Nicholas,
que tem uma forma mais grave de autismo, frequenta a mesma escola do irmão em
meio período, e complementa a educação em uma clínica especializada em terapia
comportamental, onde conta com a ajuda de profissionais de diversas
áreas.
Uma
das escolas mais preparadas para tratar e educar pessoas com autismo fica em
Nova Jersey, nos Estados Unidos.
É
uma escola pública totalmente adaptada para os 250 alunos, entre 3 e 21 anos.
Lá, os alunos aprendem profissões que possam desempenhar mesmo com as limitações
que apresentam.
Numa
área que imita uma rua de comércio, eles entendem como se organiza a
correspondência de um escritório, por exemplo, ou como se trabalha em um banco
ou supermercado.
No
Brasil, o acesso a essa qualidade de ensino depende do poder aquisitivo das
famílias.
Quem tem condições encontra boas escolas particulares como uma em
São Paulo, onde 80 alunos com o transtorno convivem em harmonia com as demais
crianças. Para conseguir emprego para os alunos, a escola fez uma parceria com
um grande banco.
Desde
dezembro de 2012, o autismo é considerado, por lei, um tipo de deficiência
mental. As pessoas que apresentam esse transtorno têm direito a benefícios na
rede pública de saúde e de ensino. A aprovação da lei só foi possível graças à
dedicação de muitos pais, em especial Berenice Piana, mãe de um rapaz com
autismo.
“A
lei é, na verdade, a Carta Magna dos direitos das pessoas com autismo no Brasil.
O ponto principal dela é: reconhece a pessoa com autismo como pessoa com
deficiência. Segundo: o direito ao diagnóstico precoce. O tratamento
multidisciplinar são vários profissionais para tratar uma pessoa com autismo. O
direito à matrícula na rede regular de ensino. É proibido negar a matrícula a
uma pessoa com autismo, sob pena de multa”, ela explica.
Mas,
na realidade, ainda há um longo caminho a percorrer. Muitos pais não conseguem
atendimento para seus filhos. Foi o que aconteceu com o Matheus. Ele é
deficiente visual e tem autismo. A mãe dele, Eliane, ganhou na Justiça o direito
de o filho receber aulas em casa com um professor da rede pública. Mas os livros
didáticos oferecidos não estão em Braille, o sistema de leitura para
cegos.
Em
uma escola municipal, em São Paulo, Yasmin, de 7 anos, recebe a orientação de
profissionais em uma sala multifuncional, adaptada para a realização de
atividades específicas. Além disso, crianças com autismo devem ser acompanhadas
por estudantes de pedagogia durante as aulas. Mas não há ainda, na rede pública
do município, estagiários suficientes. A prefeitura de São Paulo diz que está
contratando mais estagiários.
Mercado de Trabalho
A
inclusão no mercado de trabalho é difícil, mas existe. É o caso de Alberto. Ele
tem 21 anos e foi diagnosticado com autismo aos 3. Desde pequeno, ele estuda e
consegue fazer a maioria das atividades diárias por conta
própria.
Como
mostrado no último episódio, com treinamento adequado, algumas pessoas com
autismo atingem um grau razoável de independência - o suficiente, por exemplo,
para andar pela cidade e usar o transporte coletivo.
Alberto
é balconista em uma farmácia em São Paulo. Mas atingir esse nível de autonomia,
infelizmente, não é regra entre as pessoas com autismo.
Pelo
poder de concentração em uma atividade e à atenção aos detalhes, pessoas com
autismo podem ser profissionais imbatíveis.
Numa
empresa fundada na Dinamarca, hoje presente em oito países, a maioria dos
empregados está dentro do espectro do autismo. Ela vende serviços de programação
de computadores e processamento de dados. a tecnologia é um campo excelente para
o desenvolvimento das capacidades dos autistas.
O
gerente da empresa se orgulha da política de inclusão. Esse é o começo de
carreiras brilhantes para essas pessoas. Com suas capacidades desenvolvidas,
esses profissionais vão para trabalhos cada vez mais complexos, e se tornam
independentes.
Quando os pais não estiverem mais presentes, eles poderão ter
vidas produtivas e se sentir realizadas.
Futuro
O
doutor Drauzio Varella conta que, durante as gravações da série, aprendeu que o
autismo desorganiza a comunicação e as funções sociais. Que as manifestações
iniciais podem ser notadas já nos primeiros meses de vida e que é fundamental
reconhecê-las o mais cedo possível, em uma fase em que o cérebro tem grande
plasticidade para formar novas conexões, em resposta aos estímulos
educativos.
Para
compreender e educar uma criança com autismo, é preciso esforço, dedicação e
sabedoria para penetrar em seu universo, e fazer com que o nosso lhe pareça mais
acessível e menos absurdo.
Kevin
já começou esse processo. Por enquanto, ele está em tratamento clínico no Centro
de Atenção Psicossocial, o CAPS. A família de Idryss comemora as pequenas
conquistas. Hoje, os pais vão deixá-lo em casa com uma amiga e ter a primeira
noite romântica em muitos anos.